O preconceito contra as comunidades indígenas no País - e a ignorância subjacente – só não é maior que o descaso a que estão relegados os povos da floresta pelo Governo Federal, notadamente por seu braço indigenista, a Fundação Nacional do Índio - Funai.
O Povo Cinta Larga, localizado nos Estados de Rondônia e Mato Grosso, não bastasse essa discriminação, ainda sofre com a desmesurada violência decorrente do garimpo de diamantes existente em seu território. A exploração ostensiva já ultrapassou uma década e não há qualquer
horizonte à vista quanto a seu término, muito menos quanto à sua regularização. Nesse período, a Funai jamais conseguiu se desincumbir, com um mínimo de organização, de suas relevantes responsabilidades.
A descontinuidade administrativa decorrente da constante alteração das pessoas encarregadas de lidar com a questão, a ausência de estratégias adequadas, a escassez de recursos e suporte técnico-administrativo são apenas algumas das mazelas que podem ser citadas. Impressiona a total falta de condições de trabalho deixada pela direção do órgão indigenista às pessoas que se embrenharam na hercúlea tarefa de conduzir os rumos da política pró-Cinta Larga - não havia o apoio necessário, nem recursos; sobravam desinteresse e promessas vazias. O resultado é de todos conhecido. Assim, o governo que se encerrou em 2010 (ou se perpetua a partir do corrente) fez muito pouco, quase nada, para dizer o mínimo, pela causa indígena, ou, mais especificamente, pela causa indígena do Povo Cinta Larga.
Infelizmente, o governo anterior igualmente não tem muito o que comemorar também - se é que possui algo. Ou seja, o descaso para com a questão Cinta Larga, para o bem, ou para o mal, não tem escolhido partidos ou cores ideológicas; entra governo, sai governo, os índios continuam num estado absurdo de descaso e penúria. O Ministério Público Federal - MPF já realçou a imperiosa necessidade de que a questão Cinta Larga seja tratada com prioridade e preferência. Mas a Funai não parece compreender, ou, se compreende, parece não se importar com a dimensão do problema Cinta Larga; haja vista que não tem tratado a questão com a primazia necessária.
Para o órgão indigenista, a questão Cinta Larga é somente mais uma a lhe abarrotar a mesa de trabalho. A problemática, assim, está abandonada na mesma vala comum em que se amontoam os mais variados problemas da Fundação e sem qualquer perspectiva conhecida para emergir.
A nação Cinta Larga é guerreira - na acepção mais tradicional possível do termo. Sua batalha agora, entretanto, não envolve arco e flecha, mas caneta e papel. Cada vez mais ela está convencida da necessidade de dialogar com a sociedade envolvente, na forma imposta por esta (projetos etc.).
Imprescindível que, nesta caminhada, os índios continuem a ter grande coração para não deixar a luta esmorecer. Infelizmente, a espera por dias melhores é muito cruel e angustiante. Que assim seja, então. Que os índios Cinta Larga, nesta data tão marcante e em todos os dias porvir, sigam firmes no seu destino e inabaláveis em seus princípios e propósitos maiores, sem jamais
perderem a fé e esperança. As grandes conquistas pertencem mesmo apenas aos povos maiores.
A Nação Cinta Larga, que já provou seu valor por simplesmente sobreviver ao contato violento e à maldita exploração, certamente não sucumbirá diante do mais novo inimigo: um governo omisso e indiferente.
Autor: Reginaldo Trindade - Procurador da República. Pós-Graduado em Direito Constitucional.
Responsável, no Estado de Rondônia, pela defesa do Povo Indígena Cinta
Larga.